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    Quem pediu esta assembleia?

    Mistério em torno da identidade de cotistas representativos que pedem votação para temas cruciais de Fundos Imobiliários pode estar com os dias contados após o xerife CVM entrar na história

    Por Luciene Miranda
    quinta-feira, 28 de julho de 2022 Atualizado

    Dois pedidos de assembleia geral extraordinária por parte de cotistas representativos – sem nomes revelados - com mais de 5% de cotas para decidir sobre a troca de gestão do Fundo Imobiliário Banestes Recebíveis Imobiliários (BCRI11) chamaram a atenção da Comissão de Valores Mobiliários, o órgão regulador do mercado financeiro.

     

    Ambos apresentaram a mesma pauta: a substituição da gestão do fundo atualmente com o Banco do Estado do Espírito Santo (Banestes) pela Suno Asset.

     

    Quem pediu esta assembleia?

     

    Nos dois casos, os cotistas misteriosos voltaram atrás nos pedidos junto à administradora do FII, a BRL Trust.

     

    A primeira solicitação foi em 15 de junho e retirada em 11 de julho.

     

    O segundo pedido chegou à administradora pouco depois da retirada do anterior, em 15 de julho, e revogado no dia 22 do mesmo mês.

     

    Embora os pedidos de AGE para mudanças significativas nos Fundos Imobiliários tenham se intensificado nos últimos meses - a maioria também sob unanimidade - estes envolvendo o BCRI11, em particular, despertaram uma reação no 'xerife do mercado financeiro', como a CVM é apelidada.

     

    O órgão encaminhou ofício à BRL Trust em 19 de julho pedindo explicações sobre o pedido de AGE pelo cotista com 6,69% de participação no BCR11. Mais especificamente, exigiu a divulgação do nome do cotista para garantir a transparência do processo de convocação de uma assembleia.

     

    “O órgão deliberativo do fundo de investimento imobiliário possui regime jurídico caracterizado pela publicidade de seus atos e deliberações, o que afasta a incidência do sigilo previsto na Lei Complementar nº 10501 sobre as informações relativas à identidade, à representação e à participação dos cotistas”, destacou a CVM na advertência à BRL Trust.

     

    A CVM ainda complementou.

     

    “Em outras palavras, a possibilidade de realização de conclaves secretos quanto à identificação e qualidade do voto dos participantes demonstra-se incompatível com a natureza das deliberações que são atribuídas à assembleia geral de cotistas dos fundos de investimento imobiliário”.

     

    Com estes argumentos, o regulador exigiu a divulgação do nome do cotista solicitante da AGE, além de esclarecimentos sobre as medidas adotadas para identificar e mitigar conflitos de interesse, e ainda informações sobre eventuais vínculos deste cotista com a BRL Trust ou a Suno.

     

    Em resposta ao regulador, a BRL Trust afirmou que incluiria a lista dos nomes dos solicitantes no edital de convocação da assembleia.

     

    Sobre o questionamento de diligência em relação aos conflitos de interesses no pedido, a administradora informou que realizou consultas a informações públicas disponíveis na internet e pesquisas independentes em páginas de busca em nome de cada um dos cotistas solicitantes.

     

    A administradora afirmou também que utilizou sistemas de compliance e de crédito privado com base no CPF e CNPJ dos investidores, buscou informações junto à Receita Federal, Juntas Comerciais, Tribunais de Justiça, Cartórios de Protesto, Cadastro de Sanções Nacionais e Internacionais, incluindo a verificação de vínculos societários, pessoas relacionadas e vínculos familiares.

     

    Na resposta à CVM, a BRL Trust destacou ainda que os cotistas solicitantes da AGE não são partes relacionadas ou pessoas ligadas à Suno ou à administradora, ou a outros fundos administrados pela BRL Trust.

     

    O pedido por explicações sobre o processo de AGE do BCRI11 partiu, especificamente, da Procuradoria Federal Especializada da CVM, divisão responsável por representar o órgão regulador judicial e extrajudicialmente, exercer atividades de consultoria e assessoramento jurídico, além de exercer a função de fiscalização interna.

     

    Três dias após a CVM encaminhar o pedido por esclarecimentos, o cotista retirou o pedido de AGE no BCRI11. Nenhum documento oficial divulgou o nome deste solicitante ou de quem fez o pedido anterior.

     

    Os pedidos de convocação de assembleias feitos por cotistas representativos de fundos são previstos na instrução CVM 472 de 2008.

     

    O artigo 19 estabelece a representatividade do cotista elegível aos pedidos de AGE.

     

    “A assembleia geral também pode ser convocada diretamente por cotistas que detenham, no mínimo, 5% das cotas emitidas ou pelo representante dos cotistas, observados os requisitos estabelecidos no regulamento do fundo”.

     

    E o artigo 25 prevê o percentual de votos para a escolha de representantes do fundo por meio de assembleias.

     

    “A eleição dos representantes de cotistas pode ser aprovada pela maioria dos cotistas presentes e que representem, no mínimo, 3% do total de cotas emitidas, quando o fundo tiver mais de 100 cotistas ou 5% do total de cotas emitidas quando o fundo tiver até 100 cotistas”.

     

    De acordo com especialistas do mercado de Fundos Imobiliários, a postura da CVM no caso do BCRI11 pode tornar-se uma jurisprudência, que é o conjunto de decisões e interpretações das leis pelos tribunais superiores e que adapta as normas às situações de fato.

     

    Se isso ocorrer, as próximas convocações de assembleias gerais extraordinárias podem não ter mais o sigilo em relação ao nome do cotista solicitante.

     

    Para o professor de Finanças e sócio do Clube FII, Arthur Vieira de Moraes, a possibilidade de convocação de assembleias é muito importante para a dinâmica do mercado porque é uma ferramenta que permite aos cotistas exercerem de forma democrática uma pressão aos gestores e administradores.

     

    "Transparência gera valor e a decisão da CVM preserva essa importante ferramenta dos cotistas, além de conferir mais credibilidade para quem as convoca", conclui.


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