Como escritórios se tornam extensão do branding corporativo
Espaço físico passou a traduzir valores e posicionamento de marca antes mesmo da comunicação externa
"O cliente pode ter o carro da cor que quiser, desde que seja preto", disse Henry Ford após implementar a linha de montagem de carros que revolucionária a forma como o mundo se locomove. A frase, apesar de parecer uma ironia e imposição de uma preferência, tinha um viés econômico, a ausência da opção de cores reduzia os custos de produção tendo em vista que preta era cor mais barata e comprar estoque de outras possibilidades encareceria o processo.
Essa frase foi dita em um momento da história onde o produto ditava o sucesso de uma marca, as pessoas queriam o carro independente de sua cor, era uma inovação que com o passar dos anos se tornou uma necessidade, e naquele período ao menos, havia poucas opções de concorrência. No cenário em que vivemos hoje, com um mercado mais evoluído, extremamente competitivo e diversas opções para se escolher... o que te torna diferente, por que o cliente deveria optar por você?
Bom a resposta é: o posicionamento. A construção da imagem, valores e narrativas da marca que proporcionam uma personalização maior ao usuário, agora com diferentes comunicações para se consumir. Quem é mais aventureiro passa a consumir marcas que preservam o meio ambiente e tem roupas relacionadas a esportes, já quem tem um estilo de vida mais social e metropolitano, aponta seu olhar para marcas que se posicionam como mais finas e requintadas, com roupas elegantes.
Imagino que o que você deve estar pensando agora é: O que isso tem a ver com o Real Estate? Tudo. As marcas, cada vez mais querendo transpor seus valores, agora estão personalizando até mesmo seus espaços corporativos para que tenham a cara da companhia, e, para que marquem diretamente os funcionários, em seu dia a dia, o tão valioso posicionamento. Isso altera completamente a lógica de locação, com modelos personalizados passando a ter maior demanda e relevância.
Schneider Eletric
A Schneider Eletric é um grande exemplo dessa nova cultura do mercado. Em entrevista ao Resource, Patrícia Cavalcanti, vice-presidente de Digital Energy e Power Products da América do Sul conta um pouco sobre a visão para a realização do escritório da companhia: "O escritório não pode ser genérico, ele precisa ter a personalidade da empresa. Quando o colaborador entra, ele precisa sentir que está dentro da nossa marca."
Para atingir esse posicionamento Cavalcanti explica os principais critérios analisados na escolha do espaço corporativo: "Quando fomos buscar um novo escritório, uma das coisas primordiais era encontrar um local que cumprisse certificações LEED. Buscávamos um edifício que já tivesse selo de sustentabilidade [...] esse foi um ponto essencial, algo inegociável."
"Acreditamos que o mundo mais sustentável vai passar pela eletrificação, automação e eficiência. Mas não adianta pregar sustentabilidade se isso não começa dentro de casa."
Além disso a executiva mostra como a preocupação com experiência do colaborador foi abordada para reforçar os valores da marca, reforçando a coerência entre propósito e prática: "A questão da localização também conta muito: precisa ser acessível a todos, ter transporte público próximo, isso faz parte da nossa estratégia de inclusão", comenta.
"O novo escritório reflete nosso novo estilo de trabalho, hoje operamos em modelo híbrido. As pessoas vão ao escritório para interagir, debater e colaborar, o espaço foi adaptado para promover essa integração e tornar o ambiente mais inspirador. Além disso a combinação de boa iluminação, temperatura adequada e qualidade do ar influencia diretamente o bem-estar e a produtividade, tornando o espaço agradável parte da identidade da empresa", finaliza.

Fotos do escritório da Schneider Eletric
Proteções legais

Elisângela Santos da Silva Borges, Coordenadora-Geral de Marcas no INPI
Para compreender melhor as questões legais que envolvem a construção de uma marca no ambiente corporativo, o REsource entrou em contato com o Instituto Nacional da Propriedade Industrial (INPI), órgão responsável por registrar e proteger a autoria e o direito exclusivo de uso sobre criações e marcas usadas no mercado. "Nem todos os elementos que compõem um espaço corporativo podem ser registrados como marca. No Brasil, só são registráveis sinais visualmente perceptíveis que se apresentem sob forma de marcas nominativas, figurativas, mistas (combinação de nomes e imagens), tridimensionais e de posição.
Esses formatos podem ser aplicados ao ambiente em letreiros, placas ou elementos visuais, mas a fachada ou o espaço como um todo não são considerados, para fins de proteção, como marca", comentou Elisângela Santos da Silva Borges, Coordenadora-Geral de Marcas no INPI. Ainda que essa personalização seja uma tendência em constante crescimento, Elisângela ressalta a falta de conscientização das empresas sobre a importância de manter seus ativos intangíveis protegidos: "Muitas empresas desconhecem o escopo de cada tipo de proteção e acabam optando por registros inadequados, o que fragiliza a segurança jurídica da marca.
É fundamental compreender que esses ativos (nome, logotipo, design, identidade visual) são parte essencial do valor da empresa e merecem ser geridos com a mesma atenção dada aos ativos físicos."
O INPI oferece três modalidades de proteção: o Desenho Industrial que protege formas ornamentais e padrões de linhas e cores aplicados a produtos (mesa, cadeira, luminária,...); Marcas Tridimensionais, essas resguardam formas plásticas distintivas, associadas a produtos ou serviços (crocs, embagalgem do Yakult, boneco da Michelin,...) e as Marcas Nominativas, Figurativas e Mistas que preservam letreiros, placas e outros elementos visuais do ambiente.
"Hoje, a proteção não se estende à arquitetura ou ao layout em si, mas o INPI avalia ampliar o escopo dos desenhos industriais para contemplar projetos arquitetônicos, à semelhança do modelo japonês, que já reconhece o design integrado de edifícios e interiores. Trata-se de uma discussão inicial, mas que sinaliza um futuro de maior valorização do design como ativo marcário."
Urbic

Luiz Henrique Ceotto, engenheiro civil na Urbic
Por fim, a visão de quem constrói os espaços, Luiz Henrique Ceotto, engenheiro civil na Urbic fala sobre as principais mudanças na forma de se abordar um projeto hoje: "Nos últimos 15 anos, houve grande investimento em fachadas, transparência, luminosidade natural e grandes vãos. Isso melhora qualidade de vida, reduz o uso de luz artificial e reforça o posicionamento da empresa através do ambiente. "O que também é importante é o atendimento ao ser humano, o conforto dentro do escritório: pé direito alto, temperatura e umidade adequadas.... Isso aumenta a produtividade e faz parte de uma experiência de trabalho mais humanizada."
E o que podemos esperar do futuro? "O escritório do futuro será sempre um misto: funcional e simbólico. Dependerá da filosofia de cada empresa, mas deve permitir transformação interna do uso do imóvel sem torná-lo obsoleto", conclui Ceotto.